INTRODUÇÃO
Assim como nem tudo nessa vida são flores, nem todo produtor de café colhe somente café especial em sua lavoura. Portanto, para esclarecer essa história entrevistamos um grande amigo e experiente produtor de café que compartilhou sua vivência explicando como funciona a produção de cafés especiais e os cuidados que fazendas produtoras, em geral, precisam ter para alcançar uma alta produção de café especial por ano.
Fazenda que só produz café especial: mito ou verdade?
saiba tudo que acontece em uma lavoura de café
É mito! Toda fazenda está sujeita a colher café ruim ou de baixa qualidade. Porém, boas práticas no cultivo podem contribuir para uma alta porcentagem na colheita de café especial. Existem fazendas que produzem cerca de 60% de cafés especiais, o que é considerado uma alta produção. Outras alcançam 40%, mas tudo depende dos cuidados dedicados a lavoura.
Recentemente, fizemos um post explicando o que é café especial e como ele chega até sua xícara. Então, depois que terminar de ler este artigo, não esqueça de conferir.
Segundo a experiência do Álvaro Coli – produtor de café no Sítio da Torre – ele chegou a colher 70% da produção em cafés especiais em safras anteriores e relata muita dificuldade para obter este resultado.
Nesse sentido, não podemos nos esquecer que o café é um fruto que conta com várias intempéries naturais e incontroláveis, que afetam sua maturação e resultado na xícara. Tudo isso é um desafio para os produtores de café. Portanto, a pergunta que você deve sempre se fazer é: será que estou tomando café de verdade?
O que torna um café ruim?
Antes de mais nada, para ser considerado especial, o fruto do café precisa estar maduro e longe de imperfeições. Em outras palavras, cafés colhidos antes da hora ou depois que passa o tempo de maturação tendem a ser cafés de baixa qualidade.
Quando falamos de uma grande lavoura de café, nem sempre o produtor encontrará todos os frutos 100% maduros no pé. Para compreender melhor, veja as fases que o café passa até chegar em sua xícara:
1 – Chumbinho (verde e pequenino): esse é o grão que aparece quando começa o período de chuva. O fruto começa a inflar e dá origem ao café verde.
2 – Café Imaturo / Verdoengo: você percebe que a coloração mudou, mas ainda não está maduro, não está pronto para ser colhido.
3 – Cereja Madura: damos este nome aos cafés que já estão maduros, prontinhos para serem colhidos.
4 – Passa / Boia: neste estágio, ainda na árvore, ele já passou do ponto de maturação.
5 – Podre: o café já está no chão e passou completamente do seu ponto de maturação.
A questão é que, mesmo que o café seja colhido fora de sua fase madura, verdes ou boia, são aproveitados de alguma forma e vendidos no mercado como cafés tradicionais ou extraforte, sem rastreabilidade e com baixíssima qualidade.
Além disso, há também os “cafés de chão”, ou “café de varrição”, que são varridos, lavados e secos. Cafés colhidos dessa forma, são considerados cafés ruins.
Como cafés de baixa qualidade são separados na cooperativa
Depois que os cafés de baixa qualidade são colhidos e passam por todo processo da fazenda, os grãos são encaminhados diretos para cooperativa. Em seguida, os cafés são separados por produção (fazenda de origem), mesmo tendo baixa qualidade. No entanto, eles perdem sua rastreabilidade e origem quando são comercializados, ou seja, quando são vendido às torrefações (que são as marcas encontradas no supermercado). Em outras palavras, os cafés de todos produtores são misturados uns aos outros e viram uma coisa só.
Em contrapartida, cafés especias são encaminhados para um laboratório de análises sensoriais onde é torrado e o profissional degustador oferece um laudo técnico com todas as informações e características especificas do café. Após isso, ele é direcionado para a torrefação e comercializado com rastreabilidade e origem, sem misturar uma fazenda com outra, garantindo a preservação das notas sensoriais daquele fruto específico colhido maduro.
Como o café perde qualidade após colhido
É possível manter a qualidade dos cafés especiais (frutos maduros) que são trazidos da lavoura, contudo, é impossível melhorá-los no processamento do terreiro caso já tenham sido colhidos com baixa qualidade.
Um dos grandes desafios do produtor de café está no pós-colheita. Afinal, se o café não for bem manuseado nos processos do terreiro, ainda que sejam colhidos maduros, podem perder qualidade. Veja o que pode ocasionar isso:
1 – Movimentação incorreta do terreiro
Se essa etapa for feita desleixadamente, um café de qualidade pode perder seus atributos. Geralmente, produtores de café não deixam de movimentar os cafés que estão secando no terreiro nem no final de semana ou feriado. É importante que o processo seja feito de forma cuidadosa, excelente e constante.
2 – Falta de manutenção do terreiro
Considere que, por falta de manutenção, existem rachaduras no terreiro. Quando o produtor trouxer o café da lavoura, alguns grãos podem entrar nessas rachaduras e, sem perceber, acabam fermentando e afetando a qualidade de outros lotes que forem trazidos posteriormente.
Nesse sentido, o ideal é que seja feito o recapeamento de toda a área do terreiro. Inclusive, o material utilizado para fazer esse tipo de manutenção também influencia. A lama asfáltica, por exemplo, faz com que o café seque mais rápido no chão – utilizado para secagem de cafés de baixa qualidade na fazenda do produtor Álvaro, no Sítio da Torre, por exemplo, visto que ele quer “se livrar” o quanto antes daquele café ruim.
3 – Higienização dos segadores e maquinários
É essencial que seja feita a lavagem e trocas de água diariamente nos equipamentos, afinal, café é um alimento e o terreiro precisa de boas práticas de higiene.
Criação de animais junto à lavoura de café
Não é recomendado a criação de animais próximo à lavoura de café, muito menos junto ao terreiro onde acontece o processamento. Como falamos anteriormente, café é alimento e todo cuidado com a higiene do espaço onde os frutos serão processados é importantíssimo.
Além disso, até os funcionários, ao entrarem no terreiro, devem se certificar de que suas botas estão limpas para manter a qualidade do café. No entanto, há produtores de cafés convencionais de mercado (extraforte e tradicional) que criam animais e não se preocupam com isso, gerando uma bebida bem inferior.
O que existe por trás das indústrias de café extraforte
Acredite você ou não, mas os cafés tradicionais e extrafortes do mercado tem de tudo no pacote, pode ser que talvez até tenha café! Isso mesmo, são tantas impurezas, que o café estar ali é praticamente um pequeno detalhe. Inclusive, temos relatos de compradores buscando comprar a “palha gorda”, ou seja, a casca do café descascado e outros resíduos, para destiná-los a produção deste café tradicional de mercado.
Isso já foi, inclusive, constatado por autoridades em que notou-se um exagero nessa prática do mercado e acabou apreendendo algumas marcas que praticavam essa adulteração dos cafés.
Nesse sentido, a “palha gorda” obtida através dos processos que o café passa é, na produção de cafés especiais, direcionada à lavoura como adubo ou combustível para os próprios secadores. Já no mercado de cafés tradicionais existem relatos da compra dessa palha para torrar e moer junto ao café de baixa qualidade.
Por fim, coloque na ponta do lápis: se as indústrias de café extraforte disponibilizassem apenas o café de baixa qualidade puro, sem palhas ou resíduos, ainda assim não seria tão barato quanto realmente é. A conta não bate!
Todo produtor de café também produz café de baixa qualidade devido às intempéries do fruto, clima e outros temas que citamos acima. Porém, o grande diferencial do café especial está no cuidado dedicado aos frutos maduros para que não se tornem cafés ruins em sua xícara.
Diante disso, qual café você escolherá tomar hoje? O café especial, conhecido como café de verdade ou o tradicional do mercado? Fala sério, cafezeiro! A vida é muito curta para tomar café ruim!
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